23 agosto 2006

Depois da guerra

Enquanto não se resolver o conflito israelo-palestiniano, todos os conflitos no Médio Oriente serão secundários. Esta é uma convicção generalizada na região e fora dela. Ainda agora, o Irão, com os seus aliados do Hezbollah, conseguiram fazer com que Israel lhes garantisse um mês de calmaria para analisar o seu próximo passo em matéria nuclear. Teerão estica a corda da diplomacia sabendo que muito dificilmente irá pagar por isso. O Irão sente-se legitimado a desenvolver armas nucleares - mesmo que o Presidente Mahmud Ahmadinejad negue que essa seja a intenção do seu programa nuclear "pacífico" - porque ninguém impediu Israel de as ter, nem obrigou os israelitas a integrar-se no Tratado de Não Proliferação e a aceitar as inspecções da Agência Internacional de Energia Atómica. O que sabemos do programa nuclear israelita, para além das conjecturas, foi-nos dado por um homem que pagou bem caro (e ainda paga) por isso: o cientista Mordechai Vanunu. Para os persas, orgulhosos da sua civilização, ser menos considerados que os judeus é uma afronta. Além disso, se o Paquistão e a Índia puderam, impunemente, entrar no lote das potências nucleares, por que é o que o Irão não pode?
Mas, voltando ao conflito israelo-palestiniano com extensão ao Líbano. O Irão e os seus aliados sírios armaram e treinaram muito bem o Hezbollah, transformaram-no num verdadeiro exército, capaz em termos estratégico-tácticos, resistente em combate e com um arsenal para fazer frente durante 33 dias ao "invencível" exército israelita.
Israel foi quem mais perdeu com esta guerra. Mesmo que o Governo de Ehud Olmert reclame que com a sua ofensiva conseguiu que o exército libanês passasse a controlar o sul do Líbano e que uma força poderosa da ONU seja colocada nessa zona, a verdade está plasmada nas ruas das cidades israelitas: reservistas que acabaram de cumprir o seu dever no sul do Líbano contestam uma guerra vã que não cumpriu os seus objectivos.
Além disso, em termos de relações públicas, as consequências foram devastadoras para Israel: não só Olmert conseguiu que o seu exército perdesse a aura mítica de todo poderoso que tão arduamente tinha conquistado, como, ainda por cima, os bombardeamentos de infra-estruturas não militares no sul do Líbano e em Beirute e a quantidade de baixas civis entre os libaneses só serviram para afastar mais apoiantes da causa judaica.
Depois desta guerra quase inútil - quase, porque o enfranquecimento de Israel poderá fazê-los correr para a mesa de negociações, empurrados pelos Estados Unidos (que também não saíram muito bem na fotografia) -, Olmert não conseguiu a legitimidade que procurava e continuará ainda envolvido pela sombra de Ariel Sharon que também teima em não morrer polititicamente na sua cama do hospital. A única boa notícia para o primeiro-ministro israelita é que o líder dos trabalhistas, e seu principal rival, exerce como ministro da Defesa e também ficou desfocado na fotografia. E, infelizmente, mais de mil mortos depois, Israel tem uma mão cheia de nada e outra de coisa nenhuma.