26 janeiro 2006

Sobre as eleições palestinianas

A vitória do Hamas nas eleições legislativas palestinianas é uma consequência de pelo menos quatro coisas:

a) do trabalho humanitário que o movimento tem feito nas últimas duas décadas nos territórios palestinianos, com investimentos na saúde e na educação e uma presença forte nos campos de refugiados;

b) da sua posição de intransigente resistência a qualquer iniciativa israelita e da imagem de força que foi granjeando junto da população palestiniana, principalmente junto da juventude que, perante as agruras impostas pela Segunda Intifada, encaram a luta contra a ocupação como a única ocupação possível;

c) da corrupção e da perda de capacidade de influência nas ruas dos principais dirigentes da Fatah, dez anos ininterruptos no poder deixaram marcas impossíveis de lavar e afastaram de forma abissal uma elite que veio de fora e se mostrou incapaz de cativar os jovens, que representam a maioria da população dos territórios ocupados - o popular Marwan Barghouti, actualmente detido pelos israelitas, é o único membro da Fatah que parece ter capacidade para mobilizar multidões e impedir a hegemonia do Hamas, principalmente na Faixa de Gaza;

d) Israel, ao apontar o seu poderio militar para os líderes do Hamas, matando o xeque Yasin e Abdel Azziz Rantisi e transformando-os em mártires, ajudou a solidificar o poder de influência do movimento islâmico, a ponto deste conseguir recrutar adeptos até entre aqueles que não defendem as ideias integristas do movimento.

O Hamas ganhou as eleições também porque se soube manter longe do poder e das tentações do dinheiro fácil. A sua imagem impoluta serve de contraste à imagem da Fatah e da Autoridade Palestiniana que esta dominou nos últimos dez anos, olhada pela maioria como um berço de corruptos.