Viagem ao Irão
Regressado a casa depois de uma viagem ao Irão em serviço para a Agência Lusa, aqui deixo um dos textos que escrevi (uma reportagem extensa sairá no próximo dia 28 na revista "Sábado") desde Teerão:
Na República Islâmica doIrão morrer pela pátria ainda é um orgulho arreigado entre as pessoas e a presença do culto dos mártires é visível em cada esquina, apesar da crescente descrença entre os jovens no futuro da revolução.
Mesmo numa época de maior alegria como a que se assinalava no dia 09, a do nascimento do imã Majdi, o imã escondido que um dia regressará para salvar o mundo, os mortos ao serviço da pátria têm presença obrigatória nas festividades.
Durante três dias, a normalmente escura cidade de Teerão engalanou-se de luzes e papéis coloridos, principalmente no sul da capital, onde residem as comunidades mais pobres – um contraste gritante com o norte, situado mais alto na encosta da montanha e na curvados rendimentos.
Mesmo nesta ocasião, em que os pais mostram aos seus filhos as borboletas de luzes que abrem e fecham as asas, os arcos com saudações ao imã, em que as pessoas oferecem a quem passa refrescos e bolos, os retratos emoldurados dos mortos pelo Irão não podem faltar.
O cemitério dos Mártires da Revolução, um enorme campo santo em Behesht-e Zahra, nos arredores de Teerão, é um lugar de peregrinação habitual para milhares de pessoas.
Para as famílias que regularmente comparecem para cuidar da campa dos seus filhos, maridos, tios, primos, e para os outros que chegam para prestar homenagem aos que caíram para manter viva a república que o “ayatollah” Khomeiny fundou em 1979.
No entanto, tendo em atenção que só na guerra contra o Iraque (1980-88) morreram perto de um milhão de pessoas, segundo cifras oficiosas, é natural que a maior parte das famílias iranianas tenham perdido alguém ao serviço da pátria.
Os mártires possuem um lugar privilegiado na iconografia do Irão, com murais, esculturas, pinturas e símbolos dedicadas ao seu culto. Muitos prédios de Teerão exibem de alto a baixo nalguma das suas fachadas laterais rostos de heróis com nome que morreram na guerra.
As suas famílias têm privilégios que não podem ser retirados, levando, por vezes, à ineficiência da máquina estatal (que domina 80 por cento da economia) devido ao elevado número de empregados de muitas empresas – ser familiar de mártir garante emprego vitalício a muitos.
Um diplomata ocidental em Teerão contou-me que um dos hotéis de Isfahan, o principal centro turístico do país, esteve para ser comprado por um investidor estrangeiro que condicionou o negócio à possibilidade de poder reduzir os mais de 3.000 empregados a pouco mais de 300.
Disseram-lhe que sim, mas também lhe passaram uma lista com aqueles que não podiam ser despedidos por serem familiares de mártires e o investidor acabou por desistir do negócio.
Duas das principais unidades hoteleiras de Teerão, situadas na zona norte da cidade, o antigo Sheraton, que hoje se chama Homa e o ex-Hyatt, agora denominado Azadi Grand Hotel, foram nacionalizados depois da revolução e entregues à fundação de apoio aos mártires.
No cemitério de Behesht-e Zahra, o espaço dedicado aos mártires é composto por filas e filas de campas juntinhas quase sem espaço para caminhar entre elas.
Campas rasas em chão de cimento com relicários de alumínio onde figura a fotografia de 30x40 cm do morto. Bandeiras e bandeiras do Irão, imagens do imã Khomeiny, algum ou outro autocolante do Presidente Mahmud Ahmadinejad com a frase: “Vou rezar para que a justiça seja feita”.
Arash Falahatpishe tem 29 anos e tinha três quando o pai morreu numa cidade do Curdistão iraniano invadida pelos iraquianos, para ele, logicamente, o pai “é um herói”, até porque foi isso que sempre lhe disseram.
“Naquele tempo havia valores. Quando ouço falar sobre esse tempo e recordo, quase tremo, mas esse sentimento é muito difícil de explicar às outras gerações”, explica Falahatpishe.
As novas gerações estão mais preocupadas com a vida que com os mortos, apesar de continuarem a visitar a campa dos familiares, como as gémeas Sara e Sude que passeiam pelas alamedas de mão dada com os respectivos namorados.
“Não vimos aqui muitas vezes”, confessam. Não conheceram o tio e a mãe não lhes pediu para que viessem limpar a campa, embora não consigam explicar muito bem porque estão aqui. Talvez porque a calma e a tranquilidade do cemitério, a uma hora em que há pouca gente, permite-lhes desfrutar de um passeio romântico.
Junto a uma das alamedas alcatroadas do cemitério figuram três túmulos que, toscamente em metal verde, procuram imitar a cúpula de uma mesquita com dois minaretes. Um cartaz necrológico dá conta que o pai dos três irmãos mártires que ali jazem morreu este mês, duas décadas depois dos seus filhos.
Na República Islâmica doIrão morrer pela pátria ainda é um orgulho arreigado entre as pessoas e a presença do culto dos mártires é visível em cada esquina, apesar da crescente descrença entre os jovens no futuro da revolução.
Mesmo numa época de maior alegria como a que se assinalava no dia 09, a do nascimento do imã Majdi, o imã escondido que um dia regressará para salvar o mundo, os mortos ao serviço da pátria têm presença obrigatória nas festividades.
Durante três dias, a normalmente escura cidade de Teerão engalanou-se de luzes e papéis coloridos, principalmente no sul da capital, onde residem as comunidades mais pobres – um contraste gritante com o norte, situado mais alto na encosta da montanha e na curvados rendimentos.
Mesmo nesta ocasião, em que os pais mostram aos seus filhos as borboletas de luzes que abrem e fecham as asas, os arcos com saudações ao imã, em que as pessoas oferecem a quem passa refrescos e bolos, os retratos emoldurados dos mortos pelo Irão não podem faltar.
O cemitério dos Mártires da Revolução, um enorme campo santo em Behesht-e Zahra, nos arredores de Teerão, é um lugar de peregrinação habitual para milhares de pessoas.
Para as famílias que regularmente comparecem para cuidar da campa dos seus filhos, maridos, tios, primos, e para os outros que chegam para prestar homenagem aos que caíram para manter viva a república que o “ayatollah” Khomeiny fundou em 1979.
No entanto, tendo em atenção que só na guerra contra o Iraque (1980-88) morreram perto de um milhão de pessoas, segundo cifras oficiosas, é natural que a maior parte das famílias iranianas tenham perdido alguém ao serviço da pátria.
Os mártires possuem um lugar privilegiado na iconografia do Irão, com murais, esculturas, pinturas e símbolos dedicadas ao seu culto. Muitos prédios de Teerão exibem de alto a baixo nalguma das suas fachadas laterais rostos de heróis com nome que morreram na guerra.
As suas famílias têm privilégios que não podem ser retirados, levando, por vezes, à ineficiência da máquina estatal (que domina 80 por cento da economia) devido ao elevado número de empregados de muitas empresas – ser familiar de mártir garante emprego vitalício a muitos.
Um diplomata ocidental em Teerão contou-me que um dos hotéis de Isfahan, o principal centro turístico do país, esteve para ser comprado por um investidor estrangeiro que condicionou o negócio à possibilidade de poder reduzir os mais de 3.000 empregados a pouco mais de 300.
Disseram-lhe que sim, mas também lhe passaram uma lista com aqueles que não podiam ser despedidos por serem familiares de mártires e o investidor acabou por desistir do negócio.
Duas das principais unidades hoteleiras de Teerão, situadas na zona norte da cidade, o antigo Sheraton, que hoje se chama Homa e o ex-Hyatt, agora denominado Azadi Grand Hotel, foram nacionalizados depois da revolução e entregues à fundação de apoio aos mártires.
No cemitério de Behesht-e Zahra, o espaço dedicado aos mártires é composto por filas e filas de campas juntinhas quase sem espaço para caminhar entre elas.
Campas rasas em chão de cimento com relicários de alumínio onde figura a fotografia de 30x40 cm do morto. Bandeiras e bandeiras do Irão, imagens do imã Khomeiny, algum ou outro autocolante do Presidente Mahmud Ahmadinejad com a frase: “Vou rezar para que a justiça seja feita”.
Arash Falahatpishe tem 29 anos e tinha três quando o pai morreu numa cidade do Curdistão iraniano invadida pelos iraquianos, para ele, logicamente, o pai “é um herói”, até porque foi isso que sempre lhe disseram.
“Naquele tempo havia valores. Quando ouço falar sobre esse tempo e recordo, quase tremo, mas esse sentimento é muito difícil de explicar às outras gerações”, explica Falahatpishe.
As novas gerações estão mais preocupadas com a vida que com os mortos, apesar de continuarem a visitar a campa dos familiares, como as gémeas Sara e Sude que passeiam pelas alamedas de mão dada com os respectivos namorados.
“Não vimos aqui muitas vezes”, confessam. Não conheceram o tio e a mãe não lhes pediu para que viessem limpar a campa, embora não consigam explicar muito bem porque estão aqui. Talvez porque a calma e a tranquilidade do cemitério, a uma hora em que há pouca gente, permite-lhes desfrutar de um passeio romântico.
Junto a uma das alamedas alcatroadas do cemitério figuram três túmulos que, toscamente em metal verde, procuram imitar a cúpula de uma mesquita com dois minaretes. Um cartaz necrológico dá conta que o pai dos três irmãos mártires que ali jazem morreu este mês, duas décadas depois dos seus filhos.
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