15 maio 2006

“Limitar-me-ei a disfrutar, porque o Arsenal tem poucas hipóteses”

Esta é uma entrevista do escritor inglês Nick Hornby, adepto fanático do Arsenal, ao El País de hoje, a propósito da final da Liga dos Campeões desta semana entre Barcelona e Arsenal.

Vai a Paris?
Claro que sim. De certa maneira, este vai ser o jogo mais importante da história do Arsenal. Não o perderia por nada.
Uma final merece tanto sofrimento?
Continua a parecer-me incrível que uma equipa tão jovem tenha chegado à final e não creio que tenha muitas hipóteses contra o Barcelona, pelo que me vou limitar a desfrutar do dia.
Charlie George [mítico jogador dos gunners] e Thierry Henry têm estilos futebolísticos opostos, mas ambos são ícones do Arsenal. O que é que significam para si?
Não estou assim tão certo que sejam diferentes. Quero dizer, sim, têm estilos de jogo diferentes, mas ambos significam o mesmo para os adeptos do Arsenal de determinada geração: são jogadores elegantes, com talento; jogadores com os quais os adeptos se identificam e querem ver. Charlie George era de Manchester e Thierry é francês, mas a verdade é que Thierry ganhou mais jogos e marcou mais golos. A velha discussão sobre os jogadores ingleses em relação aos mercenários estrangeiros é complicada, porque Henry demonstrou uma grande lealdade ao Arsenal, embora se vá embora este Verão.
O Arsenal passou de ser uma equipa chata para se transformar numa equipa brilhante. Que mudança representou isso para si?
Coincidiu com muitas outras mudanças no futebol, mas nos últimos anos, ir ver o Arsenal tem sido como ir ao cinema ou ao teatro. Não me queixo, porque as equipas de Wenger jogam o melhor futebol que alguma vez vi na minha vida, mas agora habituámo-nos a que nos entretenham.
Quais são as chaves de essa transformação?
Há dois elementos chave. Em primeiro lugar, a contratação de Dennis Bergkamp em 1995. O segundo, e mais importante, a escolha de Arséne Wenger. Na minha opinião, toda a gente na Europa sabe que Wenger é um génio. O truque, em parte, foi fazer tudo dez vezes mais rápido do que o Arsenal estava habituado a fazer. As equipas de Wenger jogam a um ritmo incrível e o futebol a grande velocidade é muito emocionante. O efeito tem sido curioso.
De Highbury ao Fly Emirates. Do estádio de sempre a um de luxo. O que é que acha disso? Tem medo de que se produza um efeito Abramovich ou Glazer?
Acho que é o melhor para o clube. O Arsenal cresceu muitíssimo e não está bem que uma equipa assim jogue só para 38 mil pessoas. Vou ter muitas saudades de Higbury; nunca mantive uma relação tão prolongada com um lugar, mas é tempo de seguir em frente.
Levará para casa um tijolo de Highbury como recordação?
Não. Não se pode comprar nada que possa conter as recordações dos últimos 38 anos.
O que é que acha de Cesc Fábregas?
Cesc tem sido fantástico e não há dúvida que os adeptos do Arsenal o adoram. Viveu uma primeira parte da temporada um pouco dura, quando a equipa tinha dificuldades, mas jogou extraordinariamente bem contra o Real Madrid e a Juve. Estará na selecção durante muitos anos.
Qual é a sua opinião do Barça como instituição? Tem conhecimento das suas conotações e das profundas raízes do clube em Espanha?
Não acredito que se possa ser amante do futebol sem saber tudo sobre o Barcelona. O único que posso dizer é que pode ser que o Arsenal nunca mais volte a estar numa final da Liga dos Campeões enquanto eu for vivo. E se no fim resultasse que só estaríamos aí apenas uma vez, qualquer adepto do Arsenal teria escolhido o Barcelona como adversário.
E o que é que acha do Ronaldinho e do Messi?
Vi muitas vezes os dois pela televisão. Messi e Cesc são, junto com Rooney, os melhores jogadores jovens do mundo. Henry e Ronaldinho são, simplesmente, os melhores jogadores. É uma pena que o Messi não possa estar na final.
Que jogador inglês contrataria para o Arsenal?
Rooney é o melhor jogador inglês, mas Gerrard seria aquele que nos daria mais jeito agora.
O que é que acha do facto do Arsenal ter tão poucos ingleses?
A mim não me importa que não haja jogadores ingleses. O importante não é de onde vêm as pessoas, mas se querem jogar para a tua equipa. E as pessoas querem jogar com Wenger, assim que há muita estabilidade. Compreenderia que existisse uma lei que estipulasse que os jogadores deveriam de ser provenientes dos arredores do clube, nascidos a 10, 20 quilómetros do estádio. Mas a nacionalidade não é importante.
O clube está acima de tudo?
Antes de chegarem todos os jogadores franceses, tínhamos jogadores do norte da Inglaterra, irlandeses ou escoceses. O que é que eles sentiam pelo Arsenal quando eram jovens? Provavelmente, eram do Manchester United ou do Celtic! Agora contratamos jogadores africanos que são adeptos do Arsenal desde pequenos. Como afirmei antes, é um bocado complicado. Mas um jogador de clube não nasce, faz-se.