02 fevereiro 2006

O telegrama morreu

"O telegrama morreu. Foi uma morte inglória, sem honras, anunciada, ironicamente, através do meio que lhedesferiu sem misericórdia o golpe final - o correio electrónico. Foi uma morte lenta causada pelas máquinas de fax, pelas ligações telefónicas internacionais melhores e mais baratas, tornadas mais acessíveis pelo telemóvel. Numa daquelas ironias cruéis da vida, a morte do telegrama foi anunciada numa mensagem entregue pelo meio que lhe deu finalmente o golpe mortal. “Com efeito, a partir de 27 de Janeiro de 2006, a Western Union vai descontinuar todos os serviços de telegramas e de serviços de mensagens comerciais”, lê-se no “e-mail” da última companhia dos Estados Unidos ainda com serviço de telegramas. Enterrado no meio de dezenas de outros “e-mails”, este que anuncia a morte do telegrama passou despercebido. “Lamentamos qualquer inconveniência que isto lhe possa causar e agradecemos-lhe o seu patrocínio leal”, acrescenta. Inconvenientes não trará, mas deixará recordações, inevitavelmente, a muitos que tiveram de dominar a arte de poupar palavras e de omitir pontuação para poupar dinheiro. O telegrama era pago à palavra. “Chego Lisboa 15 tarde” ou “Bebé nasceu 7 todos bem” ou “Fundos precisos urgentemente”. Viagens, mortes, alegrias, doenças ou negócios de milhões – de tudo se passava informação através do telegrama. Parco em palavras – era essa a regra – mas com o essencial da mensagem todo nele contido. “Lamento informar Titanic afundado esta manhã 15 choque com iceberg grande perda de vida detalhes mais tarde”. Foi assim que Bruce Ismay do navio SS Carpathia informou o seu escritório em Nova Iorque do naufrágio do Titanic. “Preciso autoridade alugar armazém lugar chamado Hollywood 75 dólares mês”. Eram estas as palavras do telegrama enviado pelo famoso produtor de filmes Cecil B. DeMille, da Califórnia, em 1913, para os escritórios da sua companhia em Nova Iorque, anunciando, sem o saber então, o nascimento da indústria do cinema norte-americano. Na Western Union ninguém quis falar sobre a morte do telegrama. Mas um analista financeiro, John Kraft, disse que a eliminação do telegrama “do ponto de vista financeiro não tem qualquer discussão”. “Se havia custos para manter esse serviço e ninguém o usa, não há razão para o manter,” argumentou. O telegrama morreu. Alguns notaram. Poucos se importaram.Ninguém terá chorado."
(Notícia de José Pestana da Agência Lusa sobre a morte oficial do telegrama)