Um excelente texto do delegado da Agência Lusa em Maputo, Luís Andrade de Sá, sobre o sismo em Moçambique.
Maputo despertou hoje de uma noite mal dormida após uma rara experiência com um sismo de forte intensidade que não terá causado vítimas mas assustou a população, levando-a a encher as ruas durante toda a madrugada.
Os "chapas", as carrinhas informais de transporte público, andam a meio gás, as escolas estão claramente desfalcadas e as conversas giram sobre a noite em que o habitual decoro da capital moçambicana foi desfeito por uma multidão que se juntou nos passeios em camisas de noite, trajes interiores ou apenas com um lençol a cobrir o corpo.
A partir das 00:30, hora a que se registou o primeiro abalo, e até de manhã, a cidade de cimento e a cidade de caniço eram apenas uma e o receio que o terramoto provocou só era comparável à emoção de ser a primeira vez que a maioria travava conhecimento com os abalos sísmicos.
"Foi horrível o sismo a vir por ali acima. Quer dizer, suspeita-se que era um sismo", afirmou, com cautela, um morador de um dos andares mais altos da cidade.
O tom de imprecisão prosseguiu nos estúdios de alguns canais de televisão que abriram as emissões assegurando que o sismo tivera uma intensidade de "7,5 por cento", ou reclamando contra o facto de Moçambique não dispor de meios que permitem prever estes fenómenos.
O longo silêncio das autoridades ampliou as informações erradas e abriu caminho a boatos de todo o género, incluindo os que garantiam existir um horário para as inevitáveis réplicas do sismo.
"Disseram-me para esperar aqui em baixo durante 20 minutos por causa da réplica mas não posso ficar aqui toda a noite, alguém tem de fazer alguma coisa", queixava-se outra moradora, entre uma multidão de rapazes em tronco nu e mulheres vestidas com o que tinham à mão quando o primeiro abalo as tirou de casa.
A noite encheu-se de luzes de câmaras e de repórteres televisivos que mostraram aprender depressa com os exemplos que chegam de fora. "Exactamente sabe o que se passou hoje à noite?". "O que sentiu? Teve medo?". "O que estava a fazer?". A maioria estava na cama mas é impressionante o número de homens e mulheres que revelaram que se tinham deitado "depois do jogo" e que estariam ainda a "ruminar" nas incidências do Chelsea-Barcelona quando o violento balouçar da cama ou do candeeiro as tornou irrelevantes.
Informações vindas do exterior, com a chancela da credibilidade de um centro de monitorização de sismos norte-americano, colocavam o epicentro do abalo numa área a norte de Maputo e a sudoeste da Beira, cidades que distam entre si mais de 1200 quilómetros.
Mais tarde, foi determinado que o sismo ocorreu junto da localidade de Espungabera, que também usa como grafia Chipungabera, numa zona da província de Manica junto da fronteira como o Zimbabué.
Apenas de manhã veio a primeira informação, não oficial, de que, apesar da sua violência, o abalo não provocou vítimas mortais na localidade, que fica a algumas horas de carro da capital provincial, Chimoio.